A moreninha - Cap. 10. A Balada no Rochedo
10. A Balada no Rochedo
A hóspeda e o estudante
deixaram então a gruta e, tomando campo no jardim para vencer a altura do
rochedo, viram a bela Moreninha em pé e voltada para o mar, com seus cabelos
negros divididos em duas tranças que caíam pelas espáduas, e cantando com terna
voz o seguinte:
I
Eu tenho quinze anos
E sou morena e linda!
Mas amo e não me amam,
E tenho amor ainda,
E por tão triste amar
Aqui venho chorar.
II
O riso de meus lábios
Há muito que murchou;
Aquele que eu adoro
Ah! foi quem o matou:
Ao riso, que morreu,
O pranto sucedeu.
III
O fogo de meus olhos
De todo se acabou:
Aquele que eu adoro
Foi quem o apagou:
Onde houve fogo tanto
Agora corre o pranto.
IV
A face cor de jambo
Enfim se descorou;
Aquele que eu adoro
Ah! foi que a desbotou:
A face tão rosada
De pranto está lavada!
V
O coração tão puro
Já sabe o que é amor;
Aquele que eu adoro
Ah! só me dá rigor:
O coração no entanto
Desfaz o amor em
pranto.
VI
Diurno aqui se mostra
Aquele que eu adoro;
E nunca ele me vê,
E sempre o vejo e
choro:
Por paga a tal paixão
Só lágrimas me dão!
VII
Aquele que eu adoro
É qual rio que corre,
Sem ver a flor pendente
Que à margem murcha e
morre:
Eu sou a pobre flor
Que vou murchar de
amor.
VIII
São horas de raiar
O sol dos olhos meus;
Mau sol! queima a
florzinha
Que adora os raios
seus:
Tempo é do sol raiar
E é tempo de chorar.
IX
Lá vem sua piroga
Cortando leve os mares:
Lá vem uma esperança,
Que sempre dá pesares:
Lá vem o meu encanto,
Que sempre causa
pranto.
X
Enfim abica à praia;
Enfim salta apressado,
Garboso como o cervo
Que salta alto valado:
Quando há de ele cá vir
Só pra me ver
sorrir?...
XI
Lá corre em busca de
aves
A selva que lhe é cara,
Ligeiro como a seta
Que do arco seu
dispara:
Quando há de ele correr
Somente pra me ver?
XII
Lá vem do feliz bosque
Cansado de caçar;
Qual beija-flor, que
cansa
De mil flores beijar:
Quando há de ele
cansado
Descansar a meu
lado?...
XIII
Lá entra para a gruta,
E cai na rude cama,
Qual flor de belas
cores,
Que cai do pé na grama:
Quando há de nesse
leito
Dormir junto a meu
peito?
XIV
Lá súbito desperta,
E na piroga embarca,
Qual sol que, se
ocultando,
O fim do dia marca:
Quando hei de este sol
ver
Não mais desaparecer?
XV
Lá voa na piroga,
Que o rasto deixa aos
mares,
Qual sonho que se esvai
E deixa após pesares:
Quando há de ele cá vir
Pra nunca mais
fugir?...
XVI
Ó bárbaro! tu partes
E nem sequer me
olhaste?
Amor tão delicado
Em outra já achaste?
Ó bárbaro! responde
Amor como este, aonde?
XVII
Somente pra teus beijos
Te guardo a boca pura;
Em que lábios tu podes
Achar maior doçura?...
Meus lábios murchareis,
Seus beijos não tereis!
XVIII
Meu colo alevantado
Não vale teus
braços?...
Que colo há mais
formoso,
Mais digno de teus
braços?
Ingrato! morrerei...
E não te abraçarei.
XIX
Meus seios entonados
Não podem ter vala?
Desprezas as delícias
Que neles te oferecia?
Pois hão de os seios
puros
Murcharem prematuros?
XX
Não sabes que me chamam
A bela do deserto?...
Empurras para longe
O bem que te está
perto!
Só pagas com rigor
As lágrimas de amor?...
XXI
Ingrato! ingrato!
foge...
E aqui não tornes mais:
Que, sempre que
tornares,
Terás de ouvir meus
ais:
E ouvir queixas de
amor,
E ver pranto de dor!...
XXII
E, se amanhã vieres,
Em pé na rocha dura
‘Starei cantando aos
ares
A mal paga ternura...
Cantando me ouvirás.
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